(Artigo publicado no jornal O Popular de 29/04/08.)
Há pouco mais de 5 anos, em 14/02/2003, era publicado o meu primeiro artigo neste jornal: “A sociedade não está tão ruim assim...”. Lembrei-me dele por duas notícias que li esta semana: os julgamentos do médico que esquartejou uma amante e do pai que arremessou um bebê contra o parabrisas de um carro em movimento. Lembrei-me do meu primeiro artigo porque nele citei esses dois casos, entre outros, que chamavam tanto a atenção da mídia e despertavam a curiosidade e indignação do povo quanto hoje ocorre com o caso Isabella – e quanto ano passado ocorreu com o garoto João Hélio (Lembra-se? Arrastado em um carro, por ladrões, por quilômetros.).
Estas notícias atuais, sobre os julgamentos, foram pequenas, de pouca chamada, quase um rodapé em jornais e programas televisivos, ofuscados pelo caso da garota Isabella, estrangulada (pela madrasta?) e jogada (pelo pai?) do 6o andar. (Não, não escreverei sobre a lentidão em se fazer Justiça no Brasil.)
Naquele artigo, defendia que as pessoas tinham uma impressão de que a violência estava aumentando e de que os crimes estavam cada vez mais bárbaros, mas, na verdade, considerando-se outras épocas da história, talvez estivéssemos é evoluindo. Evoluindo no ritmo de “dois passos para frente e um para trás”, admiti. E que o aumento absoluto da criminalidade é esperado com o aumento da população (e da concentração desta em grandes cidades, penso hoje). E que talvez saibamos hoje de crimes demais porque temos acesso muito fácil à informação de quase qualquer lugar o mundo.
Contudo, fechei o artigo aberto à possibilidade de que talvez estivéssemos mesmo, a humanidade, entrando numa fase de declínio, “só o futuro dirá”. Pois bem, o futuro chegou, não um futuro longínqüo, mas definitivamente aqueles casos acabam de virar passado. E o que mudou?
A meu ver, quase nada (mais fios brancos e títulos mais bonitos para os artigos?). As pessoas continuam boquaibertas em frente à tevê, agora abismadas com a gratuidade da violência do caso Isabella. Mês passado foi a garota goiana torturada pela madrasta. Mês que vem será outro fato de magnitude semelhante.
Hoje vejo apenas que não percebi dois fatores essenciais para essa sensação de violência crescente: a amnésia e o interesse por sangue novo (literalmente). Um filósofo alemão, Nietzsche (1844 - 1900), disse que tudo o que aconteceu um dia tornará a acontecer novamente, eternamente. Mas o eterno retorno não precisa aguardar eternidade toda para ocorrer... A amnésia do que aconteceu há cinco anos é suficiente para que tudo seja vivido como novo, como se fosse a primeira vez que isso acontecesse na história da humanidade.
Seria simples culpar apenas a amnésia. Mas por que é que esses julgamentos atuais não são manchete? Porque “não vendem jornal”. Porque já nos satisfizemos o suficiente com aquelas histórias. Morbidamente, agora queremos nos saciar de Isabella Nardoni. Com todos os detalhes possíveis.
Mas só até o mês que vem, quando nos chocaremos novamente com algo e perguntaremos: “Aonde esse mundo vai parar, meu Deus?”...
(Leia a continuação, ou o retorno, deste texto daqui a cinco anos...)
Há pouco mais de 5 anos, em 14/02/2003, era publicado o meu primeiro artigo neste jornal: “A sociedade não está tão ruim assim...”. Lembrei-me dele por duas notícias que li esta semana: os julgamentos do médico que esquartejou uma amante e do pai que arremessou um bebê contra o parabrisas de um carro em movimento. Lembrei-me do meu primeiro artigo porque nele citei esses dois casos, entre outros, que chamavam tanto a atenção da mídia e despertavam a curiosidade e indignação do povo quanto hoje ocorre com o caso Isabella – e quanto ano passado ocorreu com o garoto João Hélio (Lembra-se? Arrastado em um carro, por ladrões, por quilômetros.).
Estas notícias atuais, sobre os julgamentos, foram pequenas, de pouca chamada, quase um rodapé em jornais e programas televisivos, ofuscados pelo caso da garota Isabella, estrangulada (pela madrasta?) e jogada (pelo pai?) do 6o andar. (Não, não escreverei sobre a lentidão em se fazer Justiça no Brasil.)
Naquele artigo, defendia que as pessoas tinham uma impressão de que a violência estava aumentando e de que os crimes estavam cada vez mais bárbaros, mas, na verdade, considerando-se outras épocas da história, talvez estivéssemos é evoluindo. Evoluindo no ritmo de “dois passos para frente e um para trás”, admiti. E que o aumento absoluto da criminalidade é esperado com o aumento da população (e da concentração desta em grandes cidades, penso hoje). E que talvez saibamos hoje de crimes demais porque temos acesso muito fácil à informação de quase qualquer lugar o mundo.
Contudo, fechei o artigo aberto à possibilidade de que talvez estivéssemos mesmo, a humanidade, entrando numa fase de declínio, “só o futuro dirá”. Pois bem, o futuro chegou, não um futuro longínqüo, mas definitivamente aqueles casos acabam de virar passado. E o que mudou?
A meu ver, quase nada (mais fios brancos e títulos mais bonitos para os artigos?). As pessoas continuam boquaibertas em frente à tevê, agora abismadas com a gratuidade da violência do caso Isabella. Mês passado foi a garota goiana torturada pela madrasta. Mês que vem será outro fato de magnitude semelhante.
Hoje vejo apenas que não percebi dois fatores essenciais para essa sensação de violência crescente: a amnésia e o interesse por sangue novo (literalmente). Um filósofo alemão, Nietzsche (1844 - 1900), disse que tudo o que aconteceu um dia tornará a acontecer novamente, eternamente. Mas o eterno retorno não precisa aguardar eternidade toda para ocorrer... A amnésia do que aconteceu há cinco anos é suficiente para que tudo seja vivido como novo, como se fosse a primeira vez que isso acontecesse na história da humanidade.
Seria simples culpar apenas a amnésia. Mas por que é que esses julgamentos atuais não são manchete? Porque “não vendem jornal”. Porque já nos satisfizemos o suficiente com aquelas histórias. Morbidamente, agora queremos nos saciar de Isabella Nardoni. Com todos os detalhes possíveis.
Mas só até o mês que vem, quando nos chocaremos novamente com algo e perguntaremos: “Aonde esse mundo vai parar, meu Deus?”...
(Leia a continuação, ou o retorno, deste texto daqui a cinco anos...)
2 comentários:
Uma corrente de criticos literarios diz q a Arte para ser arte precisa de causar "estranhamento", a linguagem literaria precisa ser diferente da linguagem cotidiana e por isso nos fazer pensar sobre as duas coisas...quando escolhemos o caso Isabella, me pergunto, se escolhemos ele pq nos causa + estranhamento pq "torturar" meninas ja se tornou banal d+ ? Assim como alguns afirmam q o ataque das torres gemeas é a maior arte do seculo XX pq elimina qualquer vinculo entre Estetica e etica... Será q estamos vendo o caso Isabella como arte? O que terá q acontecer da proxima vez para provocar a mesma comoção?
=) Daqui cinco anos voce me conta!
Vanessa,
acho que não será necessário muito mais que isso para chocar não, justamente por causa da amnésia... Aliás, este caso não é a pior coisa que já vi na vida, realmente não entendo bem como chegou a este ponto de divulgação.
A arte, ou a violência, ou qualquer coisa, impressiona os que esquecem-se que quase tudo já aconteceu antes.
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